sábado, 1 de novembro de 2014

Para Sempre Minha: Capítulo 4 — O ombro amigo (Bônus)

Oi pessoal! Desculpem a demora.

Como vocês sabem, o blog estava em manutenção e acabou demorando um pouco mais que o previsto para voltar ao normal, devido há alguns contratempos tanto na configuração do layout quanto na vida mesmo. Fiquei quase um mês sem internet e, por esse motivo, não pude me dedicar com mais à manutenção. Mas agora está tudo certo. Como vocês podem observar, estamos de cara nova! Espero que gostem e aproveitem! 

Obrigada pela compreensão e peço desculpas pela demora. Mas vou fazer valer a pena, pode deixar! Agora chega de lenga lenga e vamos por esses capítulos em dia! Boa leitura!



“Nunca foi um bom amigo quem por pouco não quebrou a amizade”.
— Provérbio popular.

Narrado por Cary Taylor
Se há uma palavra que resume bem a minha infância e minha adolescência é ‘inferno’. Nasci no meio de todo o tipo de sujeira, miséria e degradação que se pode imaginar.
Eu não faço a menor ideia de quem seja meu pai.
Minha mãe era uma viciada em crack que fazia qualquer coisa para conseguir algumas pedrinhas. E, quando digo qualquer coisa, me refiro a qualquer coisa mesmo, inclusive me oferecer para ser abusado por seus “fornecedores”.
Eu tinha nojo de ser tocado daquela forma, mas não podia fazer nada a não ser aceitar, caso contrário, eu apanharia. Antes me dessem um tiro na cabeça. Assim tudo se acabaria e eu finalmente seria deixado em paz.
Em um certo momento, alguma alma caridosa, cansada de me ver sofrer, fez uma denúncia anônima ao conselho tutelar, que retirou a guarda da minha mãe e me enviou para um abrigo. De lá, passei por vários lares adotivos. Conforme fui crescendo, eu ficava cada vez mais rebelde e insuportável. Por volta dos 11 anos comecei a consumir drogas.
As coisas nunca pareciam melhorar. Pelo contrário. Era como se cada segundo que passasse eu descesse cada vez mais fundo e a luz estivesse mais distante, a ponto de ser apenas um ponto brilhante no escuro.
Aos 14 anos, fugi de um dos lares adotivos e passei a perambular pelas ruas. Foi nessa época que descobri que tinha preferência tanto por homens quanto por mulheres. Minha primeira relação consensual não chegou nem perto de ser agradável, mas ajudou a me desligar por uns poucos instantes da vida miserável que eu levava. Estávamos num beco escuro e ele me comia com toda a força por trás em meio ao lixo. Eu só me concentrava na ardência que a fricção do membro dele causava à minha abertura apertada. Após ter gozado, o cara subiu suas calças e foi embora sem nem olhar para trás. Tudo o que me restou foi ficar ali, deitado de bruços, sentindo uma forte queimação. Não chorei. Já senti dores piores.
Havia uma revolta e uma dor enorme em mim que eu era incapaz de controlar. As pessoas nunca estavam dispostas a me compreender e me ajudar a lidar com isso. Só queriam se aproveitar de mim e mais nada. Estava cansado de ser usado. De ser alvo de segundas intenções. Por isso me drogava. Porque os entorpecentes eram os únicos que me davam algo em troca da minha entrega: o esquecimento, a diminuição da dor, ainda que por algumas horas. E, claro, como tudo o que eu queria era que aquela sensação durasse, me drogava mais e mais até chegar ao ponto de desmaiar. Eu ficava cada vez mais louco, quase impossível de ser contido. Era como eu mesmo não fosse capaz de aguentar meu próprio ser. 
Durante minhas estadias em reformatórios, sofri com a abstinência de drogas, além dos maus tratos. Minhas reações eram extremamente violentas. Perdi as contas das tantas vezes em que tentei me matar para calar de vez aquela voz demoníaca na minha cabeça, que berrava o quanto eu era insignificante e fraco. Os pesadelos me assombravam todas as noites, e oscilavam entre fatos da minha infância infeliz e coisas da minha imaginação. Nenhum psiquiatra conseguia arrancar o que quer que fosse de mim. Eu entrava no consultório mudo e saía calado. Por mais que quisesse desabafar toda aquela dor, sabia que nenhum deles me entenderia, afinal, eu era só mais um jovem perturbado e drogado de muitos que integravam as estatísticas.
Até que um dia, numa última tentativa de me fazer acordar para a vida antes que eu acabasse de vez com ela, eles me levaram ao Dr. Travis. Ele atendia numa quadra de basquete, vestia camisa e calça jeans surrada e tinha sempre uma piadinha ácida saindo de sua boca. Adular não era o seu forte. “Esperar a pessoa se abrir no seu tempo”, em sua visão, é ridículo. Se alguém fica em silêncio durante uma sessão de uma hora, é porque está no fundo do poço, e vai acabar explodindo se não botar tudo pra fora. Por isso, os casos mais extremos eram levados para ele. Por que sua forma de fazer a pessoa falar era crua e verdadeira. Nada de termos técnicos, fala mansa ou perguntas induzidas. Ele ia direto ao ponto e escancarava suas feridas mais obscuras bem na sua cara.
“Se você quiser mesmo começar a cicatrizar, tem que reconhecer seus ferimentos e admitir que eles estejam doendo. Escondê-los só vai aprofundá-los”, ele me disse.
Suas palavras me despertaram, mexeram comigo profundamente. E eu desabei num choro desesperado. Acho que passei boa parte da minha primeira sessão chorando. As lágrimas desciam sem parar. Eu não conseguia contê-las e nem queria. Meus soluços só aumentavam, ecoando por toda a quadra. E o Dr. Travis permaneceu ali, em silêncio. Foi dele que recebi o primeiro abraço da minha vida. E eu lhe seria eternamente grato por isso.
Depois do que pareceram horas, ele marcou uma consulta para a próxima semana e me mandou de volta para o reformatório. E pela primeira vez em anos, perecebi que estava mais leve. Após três sessões individuais, comecei a participar das reuniões em grupo. Todos ali tinham sofrido abusos, estavam se recuperando das drogas ou estavam tentando superar traumas que deixaram marcas permanentes.
Enquanto ele falava e apresentava cada um, uma figura miúda, com cabelos compridos, dourados e brilhantes, vestindo um moletom cinza enorme, jeans claros apertados e calçando um par de all stars surrados, chamou minha atenção de tal forma que eu não sabia explicar. Era algo diferente. Um diferente bom.
Então nossos olhos se encontraram.
Foi naquele instante, ao encarar fundo seus orbes verde-acinzentados, que tudo mudou de verdade.
Ela era incrivelmente linda. Tinha as bochechas rosadas, lábios grossos, nariz arrebitado. Eu me senti instantaneamente atraído por ela. E, vendo a forma como me encarava, deduzi que era recíproco. Ela passou a tentar sentar perto de mim em todas as sessões de grupo. Da minha parte, não houve atitude alguma. Estava focado em minha recuperação. Além do mais, sabia que ela não queria ser apenas uma amiga e sim uma bela trepada.
Desenvolvi um trauma enorme pelo fato de as pessoas só me quererem para sexo e nada mais. Minha vida inteira foi repleta de relações vazias e sem sentido. Tudo o que eu mais queria era que alguém com quem contar, mas a atenção que eu recbia sempre estava concentrada no que eu poderia oferecer em troca sexualmente. Me acostumei a isso. Tanto que foi um verdadeiro choque quando aquela menina tão perdida quanto eu me respondeu um sonoro “não” quando lhe perguntei, do nada, se ela queria ir para a cama comigo.

“Não?” perguntei chocado.
“Não”, balançou a cabeça para reforçar sua negativa. “Eu sempre usei o sexo para me desligar do mundo, para me sentir querida de certa forma, e afastar os problemas. Não vou estragar meu progresso agora”.
“Então porque você tem feito de tudo para ficar perto de mim?”
“Porque eu me sinto atraída por você”, disse como se fosse óbvio.
Franzi o cenho sem entender aonde aquela maluca queria chegar.
Ela suspirou. “Você é gato, não dá para negar. Mesmo todo detonado desse jeito”, disse sem rodeios, me deixando ainda mais chocado por sua sinceridade. “Foi impossível não sentir atração. Eu esperava conseguir alguma coisa, mas agora não quero mais. Depois da sessão de hoje decidi levar meu tratamento a sério. Então a gente pode ser amigos, se você quiser. Feito?”
Ela estendeu sua mão pequena e sem pensar eu a peguei. Desde então, nos tornamos inseparáveis.

Quando Eva apareceu em minha vida, tudo fez um sentido absurdo. Só ela conseguia me puxar daquele poço. Mesmo lidando com seus próprios demônios, linda loirinha de cabelos cumpridos e olhos expressivos irradiava uma magia do bem, que me fazia sentir um ser humano, e não o animal irracional que sempre achei que fosse.
Ela é mais que minha amiga. Eva é a minha família. É a coisa mais importante da minha vida. E sem ela, continuaria sendo o nada que sempre fui. Ou talvez estivesse morto. E é por isso que jamais a deixaria. Porque eu tinha que retribuir de alguma forma todo o bem que ela me fez. O que mais eu poderia fazer se não jurar estar ao seu lado para o que desse e viesse?
E foi com isso em mente que resolvi vir para Nova York com ela. Porque a separação era dolorosa demais para sequer ser considerada. Ela é uma parte de mim.
Conheci a mãe dela, Monica, uma mulher glamourosa, linda, sensual e riquíssima que foi a mãe que nunca tive. E Richard Stanton. Um homem cinquentão charmoso, bem-sucedido e com um coração enorme. O pai de Eva, Victor, me trata como um filho também. Aceitou minha amizade com Eva e apoiou minha ida para Nova York. Eu ganhei uma família, meio complicada, mas ainda assim, uma família.
Eva e eu nos mudamos para um apartamento chiquérrimo no Upper West Side cujo aluguel era uma fortuna custeada por seu padrasto. Era seguro, luxuoso e grande demais para nós dois, mas sua mãe fazia questão. Eva não foi a única a ficar marcada pelos abusos sexuais que sofreu durante a infância. Monica se sentia culpada e tinha ficado paranoica quanto à segurança da filha. Eu a entendia, apesar de achar algumas de suas ações um tanto exageradas, mas não me cabia julgá-las.
Minha amiga me contou aos prantos tudo o que havia sofrido nas mãos de seu ex-meio-irmão (cujo nome eu tenho nojo de pronunciar) e tive ímpetos de matar aquele doente por tê-la machucado tanto. Eu sabia bem o que era perder a inocência de forma forçada. Por isso, estava determinado a ajudá-la em tudo e a protegê-la do que quer que fosse.
Ela arrumou um emprego como secretária em uma das maiores agências de publicidade do país. A garota não precisava nem trabalhar para começo de conversa, mas sua necessidade de independência era quase uma obsessão. Uma forma desesperada de provar, não só para os outros, mas para si mesma, que estava apta a tomar o controle de sua vida, após anos sendo dominada e torturada.
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Comecei a bater de porta em porta nas agências de modelo. Eu não sabia fazer muita coisa além de maquiagem e cabelo, mas eu não podia negar minha beleza, que ficou ainda mais evidente quando me livrei do vício. As cicatrizes de cortes nos pulsos quase não existiam mais. Eu estava cem por cento na aparência. Não precisei esperar muito até que uma das agências mais bacanas da cidade, uma de que gostei muito, me chamou. E desde então, tenho trabalhado com eles.
Foi na minha primeira sessão de fotos pela agência que conheci Trey.
'Perfeição' não chega nem perto de descrevê-lo.
Ele estava trabalhando como assistente do fotógrafo. Trocávamos vários olhares durante o ensaio e meu coração acelerava em todas as vezes. Eu nunca tinha me sentido assim antes. Claro, em minha mente perturbada, ficava pensando o quanto ele devia se sentir atraído pela minha aparência. Cheguei a perceber nele um brilho diferente, mas reprimi essa ideia. Após o fim da sessão, finalmente nos conhecemos. Quando nossas mãos se tocaram, senti um arrepio desconhecido, mas gostoso. Saímos para tomar um drinque e, horas depois, estávamos em um canto escuro de um dos bares gays mais badalados da cidade trocando beijos ardentes.
Trey me fez sentir especial. E isso me deixou com medo. Mas, mesmo assim, eu não queria sair de perto dele. Nossa relação foi muito tranquila. Ele não lembra em nada os caras com quem me envolvi. Ele tem um objetivo na vida, faz faculdade de veterinária, trabalha nas horas vagas e é um verdadeiro cavalheiro. Parecia um sonho, parecia ser demais para alguém como eu. E isso foi o que nos atrapalhou. Ele queria que eu fosse fiel apenas a ele e, apesar de estar apaixonado, não podia me permitir ser apenas dele, me entregar de uma forma definitiva. E isso ficou mais evidente quando conheci Tatiana Cherlin, a modelo mais linda da agência, por quem tenho um carinho de amigo e sinto uma enorme atração, mas só isso. A gente se dá super bem na cama e temos uma relação mais liberal. Passei a viver uma vida dupla: o namorado fiel e o bastardo pervertido. E estava tudo bem para mim. Eu me sentia confortável. Trey não estava sabendo de nada, então não sofreria e eu não me culparia por magoá-lo.
Ledo engano.
Fomos pegos no flagra por ele, após eu ter lhe prometido que não dormiria com outra pessoa. Num ato involuntário, o seduzi e acabamos transando. Sei que ele se sentiu um lixo depois.
Eu também.
Usei meu charme e beleza para trazer de volta alguém que eu não queria perder. Pode parecer egoísta da minha parte, mas não consegui evitar.
Terminamos ali e eu me sentia mais perdido que nunca. Deixei o antigo Cary falar mais alto e acabei me juntando à uma turminha que havia conhecido em algumas festas. Bebi, me droguei e, de alguma forma, fui parar em meu apartamento com um homem e duas mulheres, que estavam ainda piores que eu, e fizemos uma orgia na sala. Tudo o que eu queria era esquecer. Esquecer Trey. Esquecer a dor causada pela sua ausência. Esquecer a culpa indesejada que eu sentia por magoá-lo. Esquecer o mundo à minha volta. E no processo, acabei machucando outra pessoa que significa mais que o mundo para mim: Eva.
Eu estava alterado sim, mas não a ponto de perder a lucidez. Ela ficou irritadíssima com minha atitude. Foi quando vi Ian todo alterado indo para cima dela, que percebi que estava indo longe demais.
Me senti péssimo por Eva e Trey. Finalmente eu, Cary Taylor, significava mais do que uma trepada para alguém e fui incapaz de corresponder da forma como deveria. Com minha amiga consegui me acertar, mas com ele foi mais difícil. Tentamos conversar algumas vezes, mas as coisas estavam muito estremecidas entre nós. E pioraram quando contei a ele sobre o que fiz com Ian e as garotas no meu apartamento.
Por mais que minha cabeça dissesse para desistir e deixá-lo seguir seu caminho, meu coração teimoso aliado ao meu corpo necessitado bradava para que eu fosse atrás dele. E assim fiz. Ele foi a uma festa de um amigo nosso. Também fui, mas só com o objetivo de cercá-lo. Tentei várias vezes convencer Trey a trepar comigo em qualquer canto. Sei que ele queria, mas resistiu bravamente, o que me surpreendeu bastante. Em um determinado momento, decidiu ir embora e fui acompanhá-lo. Tentei mais uma vez, mas meu ex se negou novamente. O táxi chegou e ele se foi.
Fiquei relembrando as palavras de Eva, que sempre reclamava da minha mania de sabotar minha própria felicidade. Ela estava certa. Mas eu não conseguia evitar. Era algo quase automático. Um mecanismo de defesa que eu sempre tinha em mãos quando estava em pânico.
Perdido em minhas divagações, não percebi a movimentação perto de mim.
Foi tudo muito rápido. Num momento eu estava me despedindo de Trey depois de tentar convencê-lo a transar comigo e no outro senti uma pancada forte nas costas que me fez cambalear e cair no chão. Após isso, não me lembro de muita coisa. Apenas de uma espécie de taco de beisebol me acertando em vários lugares, além de alguns chutes na barriga e nas costas. Não consegui ver quem era, porque estava escuro, e porque estava preocupado demais em tentar me defender como podia estando deitado no chão, completamente vulnerável.
Os golpes eram incessantes e cada vez mais impiedosos. Nunca havia sentido tanta dor física na vida. Não que fosse a primeira surra que eu levava. Mas, se comparado às vezes em que apanhei sem poder me defender (e foram poucas), aquela tinha sido a pior.
De repente, o mundo ao meu redor sumiu e a escuridão me tomou por completo.
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O primeiro rosto que vi ao acordar foi o de Eva. Trocamos umas palavras, mas logo apaguei de novo. No dia seguinte, já me sentia um pouco melhor. Estava em condições de conversar. Ela havia passado a noite ali comigo. Estava tudo bem entre nós, para o bem da minha sanidade.
Após trocarmos algumas palavras, Eva saiu do quarto e Monica entrou falante e alegre como sempre. Nem parecia que eu estava numa cama de hospital. Momentos depois a porta se abriu não só revelando a figura de minha amiga, mas a de Trey também. Meu coração disparou. Ver seu olhar tão doce e brilhante de lágrimas sobre mim me deixou em pedaços. Eu o amei mais ainda naquele instante. Nem vi quando as loiras mais importantes da minha vida saíram e nos deixaram a sós.
“Eu fiquei preocupado com você”, sussurrou com a voz embargada.
“Está tudo bem. Não estou no meu melhor momento, mas não há nada que uma maquiagem não resolva”, tentei brincar.
Ele sorriu um pouco, mas fechou o semblante em seguida uma lágrima deslizou por sua bochecha corada. Aquilo doeu mais do que as fraturas e hematomas resultantes do espancamento.
“Se eu tivesse ficado... Aceitado ir com você... Talvez...”.
“Não, pare”, eu o cortei, me movimentando bruscamente, fazendo uma dor lancinante atravessar meu corpo. Ignorei a vontade de gemer e continuei. “Você não tem que se sentir culpado por isso. Foi uma fatalidade. Não faça isso. Nós não temos controle sobre os acontecimentos da vida”.
“Mas mesmo assim...”.
“Por favor, Trey. Não faça isso consigo mesmo. Eu não fiquei chateado com sua recusa, mas sim com minha atitude”, desviei o foco da conversa porque não queria vê-lo se martirizar. Além do mais, era eu quem devia desculpas a ele. “Eu sinto muito por ter te pressionado. Eu não devia ter feito aquilo. Você estava tentando se proteger e eu respeito isso”.
“Eu não nunca deixei de te amar”, ele se aproximou olhando fixamente meu rosto e o tocou com a ponta dos dedos, delicadamente. Um arrepio percorreu minha pele ao sentir seu toque.
“Eu nunca senti nada parecido, Cary”, murmurou se sentando na beirada da cama. “Eu te amo tanto que seria capaz de qualquer coisa para ter você. Mas ter que te compartilhar com outras pessoas... É demais para mim”.
Fechei os olhos para apreciar melhor seu afago. “Eu sei, Trey. Eu também tenho sentimentos fortes por você. Com Tatiana é só sexo. Com você é mais. Muito mais”.
Senti seus lábios pressionarem levemente os meus uma, duas, três vezes. Sua testa se encostou à minha e ficamos assim por alguns momentos. Era tão bom sentir seu cheiro tão familiar, tão único. Nenhuma pessoa mexia comigo daquela forma.
Depois daquela conversa, decidimos ir devagar com as coisas e, aos poucos, do nosso jeito, fomos nos ajeitando.
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Quase na mesma época em que Trey e eu nos conhecemos, Eva encontrou o homem que teve o poder de colocá-la de pernas para o ar como nenhum outro: Gideon Cross, o playboy mulherengo e gostosão mais cobiçado de toda a Costa Leste. Ele tem uma fortuna infinitamente grande para uma pessoa só e, que Trey me perdoe, uma beleza arrasadora. Daquelas que é impossível de ser ignorada mesmo numa balada lotada. Somado a isso tudo, tem o fato de ele exalar problema por cada poro.
Percebi que Eva tinha ficado balançada além do necessário por ele. Além disso, Cross começou a persegui-la e os dois começaram a viver uma história louca. Eu ficava duro só de ouvir. Mas não podia deixar de me preocupar com minha amiga, principalmente se aquele rolo entre eles não desse certo. 
No dia da festa beneficente, percebi como os dois estavam sintonizados. A forma como Gideon a olhava não denotava apenas cobiça e luxúria, mas também encantamento e adoração, mesmo que o próprio não tivesse se dado conta disso. Quando Eva me contou o que aconteceu na limusine, meu primeiro impulso foi o de querer matá-lo. Eu tinha deixado claro para ele que, caso ousasse machucá-la iria se vier comigo. Contudo, analisando a situação, percebi o quanto sou hipócrita. Logo eu, que vivo sabotando tudo de bom que acontece em minha vida, não tinha o menor direito de julgar as razões que levaram Cross a agir daquela maneira.
Eles viveram uma relação muito conturbada, que incluía pesadelos horríveis da parte dele, que chegou a atacá-la durante o sono. Depois desse dia, fiquei com os dois pés atrás com ele e temi por minha amiga, que estava completamente rendida a um homem que poderia machucá-la física e psicologicamente. Mas, ao que parece, ambos não estavam dispostos a se largar e estavam lidando com seus problemas da melhor forma que podiam. As coisas ficaram ainda mais agitadas entre eles quando Brett Kline, um ex de Eva, reapareceu. Apesar de se sentir atraída por ele, minha amiga refutou qualquer chance de reatar a antiga relação deles. E, sinceramente, eu acreditava nela. Era nítido seu amor por Cross.
No dia seguinte à noite em que fui atacado, ela começou a notar que Gideon estava se afastando. Por um momento, pensei que poderia ser porque o nome dele fora associado ao que aconteceu comigo, porque duvidava que Brett fosse a causa, já que eles até saíram na mão por causa dela. A polícia levantava suspeita de que a agressão que sofri poderia ter sido motivada por homofobia. Mas não fazia sentido, porque ele bancou tudo para que Eva pudesse passar a noite comigo no hospital, conseguiu que eu recebesse visitas fora de hora, além de ter tomado providencias para que eu tivesse uma espécie de leito hospitalar em casa, com cama e poltrona especiais e uma enfermeira particular.
Semanas depois, veio a notícia de que o ex meio-irmão de Eva estava em Nova York e apareceu morto em um hotel. Após isso, as coisas tomaram um rumo inédito de calmaria que culminou no término dos dois e, infelizmente, na tristeza de minha amiga.
Mas então, aqui estou, de frente para a pessoa mais querida do mundo para mim, que só me trouxe coisas boas, mentindo descaradamente sobre estar saindo com outro cara. Será que ela pensa mesmo que me engana? Só de olhar em seus olhos dá para perceber o brilho que sumira semanas atrás. Um brilho que só Gideon Cross poderia trazer de volta. Estou chateado por ela não querer me contar, mas vou ver até quando vai sustentar essa farsa. Até porque, desde que começou a se envolver com ele, Eva mostrou claramente que seu coração o pertencia. E ela não seria capaz de amar mais ninguém. E muito menos de esconder esse amor.
De qualquer forma, o fato é que ele é um tremendo sortudo por ter Eva em sua vida, assim como eu. Acredito que, mesmo que os dois se separassem definitivamente um dia, eles sempre se amarão e pertencerão um ao outro, mesmo tentando seguir em frente com outras pessoas (coisa que duvido muito que possa acontecer). É exatamente assim que me sinto em relação ao Trey. Mesmo que a gente siga caminhos diferentes, não consigo deixar de pensar que o que eu mais gostaria era ser capaz de dar a ele metade do amor e da dedicação que ele me dá.
BEIJO GRANDE!

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