segunda-feira, 7 de setembro de 2015

Para Sempre Minha: Capítulo 12 — Areia Movediça

NÃO PULEM ESSE AVISO, POR FAVOR! NÃO VOU EXPLICAR DE NOVO O QUE EU TIVER POSTO AQUI, OK?

Oi gente! Voltei! E estou super recuperada! Obrigada pelas mensagens de melhora, e por entenderem. Vocês são sensacionais! Bom, eu prometi capítulo duplo e vou cumprir, só que como eu estava escrevendo dois capítulos ao mesmo tempo, coincidiu de eu terminar um antes do outro. Aí pensei: vai ficar um capítulo prontinho aqui dando sopa enquanto a mulherada se descabela pelo Gideon? Então lancei a pergunta lá no face: posto o capítulo pronto ou deixo para postar junto com o outro na quarta? Prevaleceu a vontade da maioria e aqui estou cumprindo a vontade de vosotros: eis o capítulo terminado no ar pra vocês. O próximo ainda está em andamento, mas já tá bem adiantado, então, don't worry!

Sem mais delongas e falatórios, vamos ao que interessa! Boa leitura!



Viva intensamente cada dia com cautela, pois o seu futuro pode cobrar o seu passado.

— Eeinalva


Após Eva ir ao banheiro, recebi a ligação de meu advogado, que queria que eu confirmasse os detalhes do acordo proposto a Ian Hager para que ele finalmente saia do meu pé. Com Deanna Johnson à espreita farejando qualquer podre que possa usar contra mim levando-o a público, todo o cuidado é pouco. E é exatamente por isso que, além da generosa quantia que pretendo pagar ao amigo prostituto de Cary, vou fazê-lo assinar um acordo de sigilo sobre a derradeira agressão ou sobre o acordo financeiro em si. A queixa também será retirada. Eu me recusei a ter qualquer encontro com esse pedaço de merda, então o acordo se dará a portas fechadas entre ele e nossos advogados. O meu até tentou protestar por não concordar com certas coisas que estavam sendo propostas, mas fui implacável. As coisas sempre saem do meu jeito e ponto final. Se eu quisesse sugestões eu o consultaria, e tudo o que fiz foi manda-lo fazer as coisas pelas quais o pago. Mesmo insatisfeito, ele aceitou e começou a elaborar o acordo por escrito.


Falar de assuntos estressantes após uma noite e manhã incríveis com minha mulher é como jogar um balde de água fria. Minha vida profissional já é cheia de bombas com as quais tenho que lidar todos os dias. Eu sei lidar com elas, pois estou na minha zona de conforto. Mas quando o tiro vem da minha pessoal, mais precisamente do meu passado, as coisas se complicam. E é nesse quesito que se encaixa Corinne, a mulher que, por pura insistência e capricho não para de me perseguir. E eu até poderia lidar com ela da forma como estou acostumado (ignorando suas ligações e investidas, óbvio), mas eu simplesmente não podia. 


Eu a usei como uma distração para meus planos. Corinne foi o caminho mais fácil que encontrei de trazer verdade para encenação que tive que fazer para cobrir minha base para o assassinato de Nathan. Eu me aproveitei de seus sentimentos e dei a entender que algo mais poderia acontecer entre nós, que meus sentimentos não tinha se ido completamente, quando na verdade eles eram inexistentes. Os sentimentos que ela diz ter por mim afloraram ainda mais e, portanto, suas reações honestas aliadas à minha capacidade de fingir muito bem criaram a situação perfeita para que todos, especialmente a polícia, pensassem que eu não teria razões para matar ex-meio-irmão de Eva sendo que eu sequer era realmente apaixonado por ela. 


Hoje sei que isso foi errado, embora necessário. Usei Corinne pela segunda vez. Dei-lhe falsas esperanças, e agora ela insiste que o que há entre nós é verdadeiro. E, desta vez, temo que ela não vá desistir tão fácil. Ainda mais agora que, para todos os efeitos, Eva e eu terminamos. 


Mas, desde a noite em que Eva descobriu a verdade sobre o assassinato de Nathan, eu venho evitando atender as ligações de Corinne. Ela me manda mensagens cada vez mais desesperadas e isso está começando a me deixar mais desconfortável que o habitual.


Tento lidar da melhor forma possível com a situação, mas está ficando difícil ignorá-la, principalmente por causa do que fiz das consequências disso, como o fato de ela estar chorando enquanto fala comigo ao telefone.


"Eu não entendo porque você tem me evitado tanto!" "Eu pensei que estivéssemos bem, mas você sumiu, não atende minhas ligações".


Agora sentado, olhando para o tampo da mesa, fecho os olhos, tentando manter a calma. "Estou em uma fase complicada do trabalho no momento, Corinne. São muitas coisas para resolver, muitas coisas que dependem da minha atenção incondicional. Você é casada com um empresário europeu de sucesso, e sabe muito bem o quanto a vida de um homem de negócios é ocupada".


Ela fica em silêncio por alguns instantes. "Isso não significa que você não possa tirar um tempo para ao menos falar cinco minutos comigo", sussurra, escolhendo ignorar a menção a Giroux. "O que está acontecendo, Gideon? Você precisa de alguma coisa? Quer que eu vá? Estou tão preocupada com você".


"Agradeço a sua preocupação, mas não", falo em um tom de voz carinhoso porém firme. 


"Então porque não posso ir?" diz com a voz embargada. "Ainda somos amigos, não somos?"


"Claro que somos amigos. Você sabe por quê... Porque eu não posso te dar o que você quer de mim", respondo, cansado de sempre ter que dizer a mesma coisa.


"Ah, não? Pois não foi o que pareceu!" rebate num tom petulante que me faz franzir a testa. "Você não está com ninguém agora, Gideon. Não há desculpas!"


"Pode parar", eu a corto friamente. "Nem pense em falar comigo nesse tom, Corinne".


Como ela se atreve a querer se impor assim? Como ela...


"Gideon", a voz sussurrada e triste de Eva invade meus ouvidos. Fico ereto e, ao vê-la escorada no portal, me levanto imediatamente.




Toda a tensão do nervosismo pelas investidas insistentes de Corinne desaparecem e meu instinto de proteção se aguça. Eva precisa de mim. 


"Preciso desligar", falo para uma Corinne chorosa e falante de outro lado da linha.


Removo o headphone e saio detrás da mesa. "O que foi? Está passando mal?" 


Eva corre até mim e no segundo seguinte eu a envolvo em meus braços com carinho e extrema preocupação. Ao olhar em seus olhos marejados e tristes, tudo o que se referia a mim foi completamente esquecido. Eva é minha prioridade. Ela é a única exceção entre tantas regras em minha vida. Ela é a única a se encaixar com perfeição em meu abraço. Meu corpo inteiro foi feito para amá-la e servi-la, da maneira que ela precisar.


"O meu pai descobriu tudo', murmura, pressionando o rosto contra o meu peito. "Ele está sabendo de tudo".


Eu a aperto ainda mais em meus braços. Eva nunca tinha dito ao seu pai o que aconteceu por temer sua reação. Se Monica, como consequência, desenvolveu tendências de perseguição paranoicas, como Victor Reyes, sendo policial e pai, além de um homem muito distinto e altamente perigoso em situações de necessidade, poderia reagir ao saber que sua única filha havia sido estuprada?


Meu telefone começa a tocar novamente. 


"Porra", solto baixinho, levando Eva para fora do escritório. 


No corredor, ouvimos seu celular vibrando insistentemente na mesinha de centro da sala. 


"Vou ver se é alguma coisa importante", falo, sabendo que o caos deve ter se instalado na família Tramell e agora todos estão atrás de Eva. E ela não está em condições de atender ninguém.


"É a minha mãe", diz nervosa e agitada. "Tenho certeza de que o meu pai já ligou pra ela, ele está furioso. Meu Deus, Gideon... Ele ficou arrasado".


"Eu entendo como ele se sente", murmuro levando-a para o quarto de hóspedes, para longe daquele inferno.


Fecho a porta, deito-a na cama, pego o controle remoto de cima do criado-mudo, ligo a televisão e ajusto o volume até encobrir todo o ruído ao redor. No entanto, o som das vozes do aparelho são incapazes de encobrir o choro de Eva, que soluça sem parar.


Ouvir esse som me parte o coração.


Sem hesitar, me encaminho para a cama e me deito ao seu lado. Coloco-a em meus braços novamente, e acaricio suas costas com as mãos. Vê-la se desfazer desta forma me mata por dentro. A única coisa que consigo pensar é que eu faria qualquer coisa para ela se sentir melhor. Eu seria o que ela quisesse que eu fosse. Eu lhe daria tudo.


No momento, ela quer que eu a abrace e a console. E é isso o que faço. Em silêncio. Nenhuma palavra seria adequada no momento. 


Após quase duas horas, ela se acalma. Seus soluços cessam e as lágrimas param de cair. No entanto, seu rosto ainda está estampado de dor, seu rosto e olhos vermelhos e inchados. E, mesmo assim, Eva continua sendo a coisa mais linda que já vi.


"Me diz o que eu posso fazer", digo finalmente. 


"Ele está vindo pra cá. Pra Nova York' sussurra. "Ele vai tentar pegar um voo hoje mesmo, acho".


É claro que ele virá. Eu não esperaria outra atitude de Victor.


"Quando souber que horas ele chega, posso ir com você até o aeroporto".


"Você não pode..." 


"Não o cacete", eu a corto sem pestanejar. Eu jamais a abandonaria nesse momento de necessidade.

Ela beija boca em meio a um suspiro. "É melhor eu ir sozinha. Ele está chateado. Não vai querer que ninguém o veja nessas condições".


Balanço a cabeça em compreensão. No lugar de Victor eu sentira o mesmo. "Então vai com o meu carro".


"Qual deles?" 


"O DB9 do seu novo vizinho".


"Oi?" ela franze a testa.


Dou de ombros. "Você vai saber qual é assim que entrar na garagem".


"Estou com medo", murmura, enroscando suas pernas bambas ainda mais com as minhas. 


Ao longo de nossa conturbada relação Eva sempre mostrou a tendência de se deixar ser cuidada em uma relação. Ela precisa de alguém forte, centrado e que tome as decisões que não conseguiria. Quando nos afastamos, essa confiança em mim depositada foi quebrada e, mesmo agora, ainda tenho medo de que jamais seja recuperada. No entanto, aqui estamos nós, desta vez, eu sendo sua rocha, dando-lhe o consolo necessário, me pondo como seu alicerce, seu bote salva-vidas. E, saber que ainda temos esse tipo de sentimento em relação ao outro (o de dependência mútua para recuperar a sanidade e a serenidade em momentos tempestuosos), me dá esperança de seguirmos em frente e conseguir superar esse trauma.


Passo os dedos pelos meus cabelos. "De quê?" 


"As coisas entre mim e a minha mãe já andam difíceis pra caralho. Se os meus pais resolverem brigar, não vou querer ficar no meio. Você sabe como eles se comunicam mal... principalmente a minha mãe. Eles são loucos um pelo outro".


Fico surpreso com esta revelação. "Eu não sabia disso".


"É porque você nunca viu os dois juntos. Rola o maior clima", explica. "E o meu pai até confessou que ainda é apaixonado por ela. Só de pensar nisso me bate uma tristeza..." 


"Por que eles não estão juntos?" pergunto achando tudo isso muito curioso e estranho. Quer dizer, se se amam tanto, porque seguir a vida separados?


"Pois é, porque não somos uma família unida e feliz", completa. "Não dá pra imaginar como eles conseguiram passar a vida inteira longe da pessoa que amam. Quando eu perdi você..." 


"Você nunca me perdeu", pontuo.


"Foi como se uma parte de mim tivesse morrido. Ficar com essa sensação pra sempre..." 


Acaricio seu rosto com os dedos. "Deve ser um inferno", e sei bem do que estou falando. 


Ficar sem Eva por quatro dias – quando nos separamos por causa do meu primeiro pesadelo que ela presenciou – eu fiquei um lixo. Mas não foi nada comparado à nossa última separação. Passar tanto tempo sendo obrigado a me afastar da única pessoa que eu queria ao meu lado pelo resto da vida foi brutal, e somando o peso de ter tirado uma vida, ainda que necessário, tornou tudo ainda pior. Se Eva tivesse me rejeitado depois do que fiz, eu não sei o que seria de mim. Eu faria qualquer coisa por ela, e se eu tivesse que cometer atrocidades no processo, eu não pensaria duas vezes. Mas também teria que ser forte para aguentar as consequências que viriam a partir disso. Se há uma coisa que aprendi com a morte de Nathan é que mesmo os pecados cometidos em nome do amor são passíveis de cobranças. A culpa por mata-lo ainda me atormenta, e sei que isso me seguirá enquanto eu viver, mas ficar sem Eva é inconcebível para mim. Eu tinha que libertá-la de seu inferno, mesmo que isso significasse que eu nunca conseguiria sair do meu.


"Pode deixar que eu cuido da sua mãe", declaro, decidido a dar o próximo passo.


Ela pisca os olhos, um tanto atordoada e confusa. "Como?" 


Curvo os lábios em um pequeno sorriso torto. "Vou ligar pra ela e perguntar como você está, se está bem. Dar início ao meu processo de reaproximação pública de você". 


Eu não vou ficar mais nenhum segundo sem Eva. E não vou mais me esconder. O perigo passou. Com o resto podemos lidar, desde que estejamos juntos.


"Ela sabe que eu contei tudo pra você. Pode ser que dê um chilique", avisa.


"Antes comigo do que com você", eu estava acostumado a lidar com mulheres histéricas. Monica Stanton não me assusta nenhum pouco.


Há uma ameaça de sorriso em seus lábios. "Obrigada". 


"Vou distrair um pouco a cabeça dela, mudar o foco das coisas", ponho a mãos sobre a dela e mexo no anel que lhe dei, deixando claro que estou falando de nosso casamento.


Evito dizer a palavra em voz alta, pois não quero que Eva se sinta pressionada ou fique ansiosa, ainda mais agora, no estado em que está. Ela sabe que isso é real para nós, que vai acontecer e que não há volta. Seu medo a impede de apreciar a ideia de nos unirmos de forma tão permanente. Mas ela ainda teria um tempo para se acostumar à ideia. Apesar de um pouco receoso sobre sua reação à cerimônia que estou preparando, eu sei, em meu coração, que ela dirá sim. 


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Estou preocupado. Muito preocupado. 


Eu já presenciei a tristeza de Eva em muitos momentos, mas este em especial está me matando. A ligação que ela tem com o pai é do tipo da que eu gostaria de ter tido com o meu. Ela o ama tanto, que tentou poupá-lo no momento em que precisava do apoio que seu pai oferecia sem hesitação. Mas ela estava cansada de ver o quanto aquele assunto atingia as pessoas ao seu redor. Sua mãe, que vive consumida pela culpa e pelo medo constante de perder a filha; Cary, que foi violentamente espancado por Nathan como retaliação por não ter conseguido o me subornar em troca de sigilo, até mesmo Stanton, que usou de seu dinheiro e influência para não permitir que a situação viesse à tona. E eu. Eu comprei a briga de Eva como se fosse a minha própria, e resolvi a questão de uma vez por todas, e estou pagando caro por isso. 


Analisando tudo de forma fria e seca, Victor tem toda a razão de estar magoado, triste e com raiva. Magoado por ser o último a saber. Triste por não ter feito nada para proteger sua única filha e com raiva do desgraçado que lhe fez sofrer. Eu odiaria estar em seu lugar, saber que um segredo tão sombrio do qual ele tinha direito de saber, lhe foi escondido. 


E sei que Eva se sente culpada por colocar seu pai. Não por não ter contado a ele. Talvez, se o próprio Victor não tivesse procurado saber a verdade, havia uma grande possiblidade de ele nunca tomar conhecimento dela. Sua culpa tem mais a ver com a reação dele ao saber o que Nathan lhe fez. 


Ela está abalada e fragilizada, e precisa de mim. Entro em alerta máximo. Não querendo sufoca-la ainda mais, procuro disfarçar minha preocupação. Mas acho que não estou sendo bem sucedido. De qualquer forma, Eva não parece se importar. Fico por perto, sempre vigilante e solicito, pronto para fazer tudo o que ela quiser, suprir cada necessidade que ela venha a ter. 


Eva vai ao banheiro. Dez segundos depois, lá vou eu. Chego perto da porta fechada e ouço com atenção a qualquer ruído suspeito. Mas quando ela sai, me encontra sentado na cama mexendo disfarçadamente em meu notebook. Olho para ela como quem não quer nada e lhe lanço um sorriso. Ela me encara, e sorri fracamente para mim antes de sair. Aguardo vinte segundos, e saio do quarto.

Eva está sentada no sofá, assistindo TV. Fico perambulando como se estivesse ocupado, mas não tiro meus olhos dela. E assim ficamos pela próxima hora. Aonde ela vai eu vou. Invento vários pretextos para estar no mesmo cômodo que ela. Em um determinado momento, ambos estamos sentados na sala. Enquanto seus olhos estão grudados em uma série policial, estou sentado ao seu lado, fingindo ler alguns relatórios em meu notebook. De repente, sua barriga ronca alto, me fazendo olhar para ela. Seus bochechas coram de forma adorável. Eu quero muito lambê-las, mas não é hora para isso. Imediatamente, me levanto e vou até a cozinha providenciar nosso almoço: sanduíches, um pacote de babatas fritas e uma salada de macarrão.


Comemos no balcão da cozinha, e vejo com satisfação que ela está um pouco melhor. É visível que meus cuidados a fizeram se sentir mais segura e calma. Eu quero fazê-la se sentir assim para sempre. Eu quero cuidar dela para sempre.


"O que a Corinne queria?", pergunta de repente. "Além de você".


Fecho a cara, lembrando-me da tensão que se estabeleceu entre mim e minha amiga e pasmo por Eva pensar nela num momento como esse. "Não quero falar sobre ela".


"Está tudo bem?" pergunta intrigada.


"O que foi que eu acabei de dizer?" 


"Uma desculpa esfarrapada que eu preferi ignorar", arqueia a sobrancelha.


Bufo, frustrado por sua teimosia, mas não vou ficar escondendo nada dela. "Ela está chateada".


"Chateada de gritar e esbravejar ou de cair no choro?" 


"E isso faz diferença?" Para mim é tudo a mesma coisa, depende do tipo de mulher apenas. 


"Claro, uma coisa é ficar puta da vida com um cara, e outra é estar na pior por causa dele. Por exemplo: Deanna está puta e quer acabar com a sua reputação; eu estava na pior por sua causa, mal conseguia levantar da cama todos os dias".


Suas palavras me acertam forte no peito, fazendo meu coração se contrair pela culpa. "Minha nossa, Eva", pego sua mão na minha. "Eu sinto muito".


"Já chega de pedir desculpas! Você vai compensar tudo isso aguentando o chilique da minha mãe. E então, Corinne estava puta ou na pior?" 


"Ela estava chorando". Faço uma careta ao lembrar dos soluços de Corinne do outro lado da linha. "Estava descontrolada".


"Sinto muito por isso. Só tome cuidado pra não deixar que ela faça você se sentir culpado".


"Eu usei ela", digo baixinho, "pra proteger você".


Eva larga o sanduíche de lado e me olha. "Você disse ou não disse que só o que tinha a oferecer era sua amizade?" 


"Você sabe que sim. Mas também dei a entender que poderia rolar mais, pra despistar a imprensa e a polícia. Ficou algo no ar. É por isso que eu me sinto culpado", e envergonhado. 


Eu agi exatamente como o perfeito canalha que fui ao longo dos anos e que prometi a mim mesmo que não seria nunca mais. 


"Pois pode parar com isso. Aquela vadia fez de tudo pra que eu pensasse que você estava transando com ela", ela ergue dois dedos de sua mão, "duas vezes. Na primeira vez, fiquei tão magoada que ainda não superei o trauma. Além disso, ela é casada, porra. Não tem nada que ficar dando em cima do meu namorado se tem marido em casa".


O quê?


"Espera um pouco. Que história é essa de fazer você pensar que eu estava transando com ela?" pergunto, completamente confuso.


"A primeira vez foi no dia em que brigamos no seu escritório por causa da suposta mancha de batom em seu colarinho. Corinne estava saindo do Crossfire toda descabelada, com as bochechas vermelhas e com a roupa um pouco desalinhada e amarrotada. Estava com o maior sorriso estampado naquela cara de pau. Subi para te encontrar e vi seu escritório bagunçado, você saindo vestindo outra roupa e, para coroar a mancha vermelha no colarinho, que inclusive batia com a cor de batom que Corinne estava usando. Qualquer uma em meu lugar pensaria exatamente a mesma coisa que pensei: que vocês estavam trepando".


Fico parado, olhando para Eva, completamente surpreso e indignado. Eu não posso acreditar que Corinne, a mulher que acreditei ser minha amiga, apesar de seus óbvios sentimentos por mim, a mulher com quem achei que queria me casar, seria capaz de algo tão sórdido. Estou sem palavras.


"A segunda vez", continua Eva diante de meu silêncio atordoado. "Foi no dia em que fiz uma visitinha ao apartamento dela que, oh que surpresa, fica em um prédio na mesma rua que o seu. Ela me fez esperar por vinte minutos na portaria antes de liberar minha entrada e, quando abri a porta, ela estava vestida apenas com um robe de seda, descabelada e com cara de quem havia acabado de dar gostoso. E, oh que surpresa novamente, fingiu que o cara que a havia comido era você".


Eu não fazia ideia de que Corinne poderia ser tão mau-caráter assim. Ela piorou e muito minha relação com Eva. O incidente da camisa foi uma infeliz coincidência. E Eva claramente ainda sente o baque. 


Eu não perdoaria Corinne por nenhum desses incidentes.


"Isso muda bastante as coisas", comento finalmente. "De fato não temos mais nada a dizer um pro outro".


"Obrigada", ela está claramente aliviada.


"Tudo isso vai passar, mais cedo ou mais tarde", digo, colocando uma mecha de seu cabelo para trás de sua orelha.

"E o que nós vamos fazer depois disso?", murmura. 


"Ah, com certeza eu vou conseguir pensar em alguma coisa", murmuro de volta.


"Em sexo, né?" Ela sacode a cabeça. "Eu criei um monstro". 


Não pensei exatamente nisso, mas já que a questão foi colocada em pauta... Eu não me nego a discuti-la e muito menos em colocá-la em prática. 


"E tem também o trabalho... nossa parceria", lembro. 


"Ai, meu Deus. Você não desiste", fala num tom exasperado.


Pego uma batatinha do pacote e mordo um pedaço. "Depois do almoço, quero que você veja a nova versão do site da Crossroads e das Indústrias Cross".


Ela limpa a boca com um guardanapo. "Sério? Que rápido. Fiquei impressionada".


"Dá uma olhada primeiro e depois me diz se ficou mesmo".


Terminamos de comer, mantendo a conversa o mais amena possível, evitando assuntos mais pesados. Lavo a pouca louça que sujamos enquanto Eva joga fora as embalagens e os restos do almoço.


Em seguida, levo-a pela mão até a sala e lhe passo o notebook que estava na mesinha de centro. O trabalho ocupará sua cabeça. Eva ama o que faz e não há terapia melhor do que fazer o que amamos quando estamos chateados. Deixo-a sentada no sofá e aproveito para ir até o escritório ligar para minha sogra. 


Conheço bem a dinâmica de relacionamentos entre pessoas que pertencem à nata rica e privilegiada. Um homem na minha posição só se reaproxima da mulher desejada através de sua mãe, se tiver intenções com ela. E isso significa muito para mães como Monica Stanton. Considerando o quando ela deve me odiar agora por ter "rompido" com Eva, esse é o melhor e mais acertado caminho. No fundo, ela sabe que sou o homem ideal para sua filha, e irá reconsiderar sua opinião sobre mim, se eu lhe mostrar que estou interessado em reaver nosso compromisso. E dizer isso diretamente a ela fará uma grande diferença.


Disco o número de seu celular e aguardo. 


"Olá", a voz ansiosa de Monica atende após o segundo toque.


"Bom dia, senhora Stanton", apelo para a polidez, já que tecnicamente, perdi o direito de chamá-la pelo primeiro nome. "Aqui é Gideon Cross".


"Gideon", ela parece momentaneamente surpresa, mas logo se recupera. "Como vai?"


"Bem, na medida do possível. E a senhora?"


"Poderia estar melhor", "Porque não deixamos as amenidades de lado e vamos direto à única razão pela qual você ligaria para mim?" 


Vai com calma, Cross, penso. Seja humilde e carismático e vai ficar tudo bem.


Pigarreio. "Bom, eu gostaria de perguntar sobre Eva. Há um tempo não tenho notícias dela e, desde que eu soube da morte de Nathan, tenho ficado preocupado. Eu pensei em entrar em contato diretamente, mas percebi que seria inapropriado".


"Ah, claro. Eu soube que você foi chamado para depor. E não, não seria nada apropriado. Soaria como uma jogada muito suja usar tal pretexto para se reaproximar dela, aproveitando-se de seu momento de fraqueza, quando você deveria simplesmente assumir seus erros e pedir desculpas", rebate asperamente.


Uau. "Exatamente. Então, achei melhor ligar para a senhora e...".


"E tentar se reaproximar dela através de mim?" corta. "Isso realmente foi uma jogada esperta de sua parte. Mas quero que saiba que isso não muda o fato de que você foi um canalha inescrupuloso com minha filha. E que eu não gostei nada disso, Cross. Não mesmo".


Puta merda! Ela acabou de me chamar de canalha inescrupuloso?


"Eu entendo sua posição, senhora Stanton. E eu sinto muito pelo meu comportamento. Eva significa tudo para mim, e eu me odiei por cada segundo em que a fiz sofrer".


"E você deve mesmo lamentar. Minha filha merece mais do que isso. Você pode ser um dos homens mais poderosos do mundo, mas isso não lhe dá direito algum de humilhar minha filha publicamente da forma que você fez. E muito menos de achar que pode tê-la a hora que bem entender. Ela não é uma mulherzinha qualquer. Eva tem um nome, é uma herdeira de uma família tão proeminente quanto a sua, e merece ser respeitada".


"Eu posso lhe garantir que nunca tive a intenção de humilhá-la. Foi apenas...".


"Suas intenções são irrelevantes visto que o resultado foi o oposto", ela me corta novamente. "Eu acompanhei cada passo seu na imprensa desde o momento em que fiquei sabendo que você e Eva estavam se envolvendo. Fiz muitas pesquisas – não que eu já não soubesse tudo o que há para saber sobre você – mas você estava saindo com a minha filha, então minhas buscas tinham que ser menos... Superficiais, por assim dizer". Ela faz uma pausa. "Eu estava feliz, Gideon. Feliz que minha filha tinha encontrado um homem digno de tê-la. Um homem que lhe daria o mundo, que faria qualquer coisa que ela quisesse. Eu já estava imaginando um futuro maravilhoso para minha Eva... E então você me aparece nos tabloides com sua ex, em momentos de visível intimidade", sua voz muda bruscamente. "Eu fiquei muito chateada. E não, não foi porque minha filha tinha perdido um bom partido, mas porque que você a magoou gratuitamente. Você teve a audácia de acreditar, por um milésimo de segundo, que Eva não está à sua altura".


Minha cabeça começa a latejar um pouco com sua fala rápida e hostil. Minha nossa!


"Se há uma coisa", ela prossegue sem me dar tempo de rebater, "que nunca deixei de ensinar à minha filha é o valor que ela deve se dar em primeiro lugar. Então, de agora em diante, se você realmente quer ter Eva de volta à sua vida, nunca se esqueça do valor dela, pois eu jamais permitirei que ela se esqueça. Além disso, há muitos outros homens nesse mundo tão ricos e poderosos quanto você que, assim que botarem os olhos em Eva, saberão lhe dar o valor devido", sua voz sai afiada como uma navalha.


O tom de ameaça em sua voz me faz perceber o quanto subestimei Monica Stanton. Ela pode até ser uma mulher frágil e um tanto fútil, mas não é do tipo que aceita ser passada para trás. Claro, disso tudo eu já sabia. O que eu não contava era que minha persuasão não iria vencê-la tão facilmente numa queda de braço que envolve o bem mais precioso que ela possui: Eva. Monica defende sua cria com unhas e dentes, faz o que for preciso. Qualquer homem com o mínimo de esperteza saberia que é impossível dobrar uma mulher assim sem antes sentir as consequências. 


Recuperando-me do bombardeio, tento organizar meus pensamentos e argumentar ao meu favor. Preciso voltar a ter o controle sobre a situação.


"Isso nunca passou pela minha cabeça, Monica", eu explico. "Eva é a mulher perfeita para mim. Corinne e eu não tivemos nada, eu juro a você. Foi só um reencontro de amigos. Sim, somos íntimos e sim, fomos noivos, mas não houve nada mais, eu posso lhe garantir".


"Que intimidade estranha você possui com sua amiga ou seja lá o que for" retruca debochadamente. "Suas palavras só valerão algo para mim quando acompanhadas de atitudes correspondentes, Gideon. E, até o momento, elas não têm significado algum para mim".


Suspiro. "Escute. Eu sei que cometi erros com Eva e gostaria de ter uma segunda chance. Quero poder consertar as coisas. Você sabe tão bem quanto eu o quanto a amo, e eu já mostrei isso de muitas formas".


Ela fica em silêncio, absorvendo minhas palavras, provavelmente se lembrando do que fiz por Cary quando ele foi atacado, ou de como reagi ao saber do que Nathan fizera a Eva. Não queria ter jogado estas cartas, mas não há outro jeito. 


"Não posso tomar nenhuma atitude se não tenho espaço para tal" prossigo. "Preciso que acredite no meu amor por ela, que acredite em mim quando digo que a quero de volta, e me dê uma chance real de provar isso".


"E o que você pretende fazer?" pergunta cautelosamente depois prosseguir em silêncio por mais alguns segundos.
 

"Casar com Eva". 


"Casar?" guincha.


"Sim. Eu percebi, durante nosso rompimento, que a quero em minha vida de forma permanente. Não somos mais adolescentes, senhora Stanton. Eu a quero ao meu lado como minha esposa. Não nego meu passado. Tive sim várias mulheres, dentre elas Corinne, de quem inclusive já fiquei noivo. Mas não consegui imaginar nem ela, nem mulher alguma ocupando esse lugar. Eva é a única a quem eu vou amar e querer desta forma. Não há mais ninguém para mim".


Um silêncio atordoado se segue à minha declaração. E nesse momento, sei que estou no controle novamente. Não há nada mais lisonjeiro para uma mulher vaidosa como Monica do que ter um homem como eu completamente apaixonado por sua filha, e se expondo sem a menor vergonha.


Ela suspira. "Bem, eu já imaginava que isso fosse acontecer, não cedo, talvez em um ano, mas depois do que houve entre vocês, tive minhas dúvidas".


"Nunca escondi o que sinto por ela, nunca nem mesmo fiz o menor esforço para isso".


"Homens como você nunca fazem nada pela metade, Gideon. Eu sei disso muito bem", comenta com um ar entendedor. "Sei que Eva ainda sente algo por você, mesmo que tente disfarçar. Eu a conheço. Mas ela está magoada, e se a quiser de volta, terá que fazer melhor do que vem feito até aqui. Nem sempre o amor é suficiente para sustentar uma relação. É preciso mais... muito mais", ela diz e sua voz falha um pouco na última frase. Ela me parece um tanto... desolada. Um flash de Eva me contando sobre o amor que seus pais sentem um pelo outro mesmo estando separados me vêm à mente e esclarecem tudo. 


Porém Monica logo descarta seu momento de tristeza e volta ao normal. "De qualquer forma, estamos falando de um casamento que deve ocorrer em breve, suponho?"


"Dentro de alguns meses, no máximo. Apenas gostaria de sua autorização para seguir em frente nos meus planos de me reaproximar dela. Desta vez não pretendo falhar, senhora Stanton. Fazer de Eva a próxima senhora Cross é meu objetivo de vida no momento".


"Eu não esperaria menos de você", "Desde quando eu vi a forma como você olhava para minha filha no hospital, quando passamos aquele susto horrível com Cary, eu percebi que você faria qualquer coisa por ela, que você cuidaria dela e de todas as suas necessidades. Eu sabia que ela estaria em boas mãos. Eu não estava enganada de todo afinal".


"Agradeço sua confiança em mim, senhora Stanton", digo incapaz de esconder minha satisfação.

"Ora, você conseguiu tudo o que queria comigo, não acha? Pode voltar a me chamar de Monica, como sempre".

Sorrio de sua perspicácia. De fato, uma mulher que não pode ser subestimada.


"Obrigado, Monica. Seu apoio é muito importante para mim. Principalmente agora". 


"Acho que esse é um bom momento para você se aproximar. A coisa com o Nathan já passou de qualquer forma. Ela ficou abalada no começo, mas agora está bem, na medida do possível. Tem saído com amigos e feito todo o possível para seguir em frente. Tenho orgulho da mulher corajosa que ela se tornou", diz com um toque de tristeza na voz, provavelmente por causa da briga entre as duas.


"Sim, ela é uma das mulheres mais fortes que já conheci. Esse é um dos vários motivos que me fazem amá-la tanto".


"É", suspira ainda mais triste.


"Você também foi muito forte, Monica", digo condescendente. "Você teve que lidar com muitas coisas em tão pouco tempo. A gravidez precoce, a... situação com Nathan. Não é nada fácil, mas você conseguiu. Somos passíveis de erros mesmo quando tentamos acertar, mesmo quando achamos que o que estamos fazendo é certo. Você não desistiu de Eva, não deixou a situação acontecer, tomou as providências necessárias, lutou por justiça. Nem todos são capazes de tirar tamanha força em meio a tanta desgraça. E isso te faz uma mulher admirável. Seja lá o que estiver acontecendo entre você e ela... vocês vão se resolver".


Ela inala bruscamente. "Como você...".


"Seu tom de voz mudou. Está mais triste. Presumi que algo tivesse acontecido entre vocês", pensei rápido. Ela não pode nem imaginar que Eva e eu já estamos juntos.


"Eu contei a ela sobre o Rolex" diz com a voz embargada. "O Rolex tinha um rastreador. E Eva ficou tão chateada, tão decepcionada. Não sei se vamos conseguir superar isso. Não poder manter contato direto com ela está me enlouquecendo". 


"Dê a ela um tempo, exatamente como eu fiz. Eva é muito passional e leva tudo ao limite. Entendo que ela tenha se sentido sufocada; a confiança foi quebrada. Aquele relógio significava muito para ela. Foi um golpe forte. Agora, ela precisa de espaço. Deixe-a dar os próximos passos. E deixe o fantasma de Nathan ir embora. Se Eva conseguiu superá-lo, você também irá conseguir. Não baseie sua vida e sua relação com sua filha nesse medo, ou vai acabar destruindo o que vocês têm. No final você vai permitir que ele ganhe. Não deixe o Nathan ganhar, Monica".


Ela não diz nada, mas escuto sua respiração pesada, provavelmente tentando segurar o choro. Dou-lhe o tempo que ela necessitar para se recompor.


Após alguns minutos, Monica volta a se manifestar. "Sim, eu vou pensar nisso. Obrigada. Gideon. Você é realmente um homem íntegro e será um excelente marido para minha Eva".


"Farei tudo o que estiver ao meu alcance para isso. Bom, eu não vou ocupar mais do seu tempo. Obrigado por me escutar, Monica. E por me dar uma segunda chance. Prometo que não vai se arrepender".


"Ah, querido, imagine", ela sorri novamente. "Você tem alguém torcendo por você aqui. Sei que não vou me arrepender. Raramente me engano com as pessoas. E agora, mais do que nunca, sei que não estava errada a seu respeito. Espero que nos vejamos em breve".


"Eu também. Tenha uma boa tarde".


"Você também, Gideon". E ela desliga.


Coloco o telefone de volta no gancho e me sento pesadamente em minha cadeira. Eva não estava brincando. A mulher é uma montanha-russa emocional quando está chateada. Eu achava que estava lidando com uma versão mais velha de Eva, mas estava redondamente enganado. A mãe é cem vezes pior que a filha. Richard é um verdadeiro santo por aguentar tudo isso. 


Eu nunca tive que me esforçar tanto para agradar mulheres como ela. As mães no geral me adoram, tanto pela beleza quanto pela minha conta bancária. Se bem que minha aparência é só um bônus. Elas me adorariam mesmo se eu fosse feio como um demônio. E não hesitariam em jogar suas filhas bem-nascidas e bem-educadas em internatos nas minhas mãos, ou em se jogar. Tudo depende do tipo de interesse que elas desenvolvem por mim. E mesmo que eu as magoasse, mesmo que eu agisse como um completo canalha, elas ainda viriam se arrastando, implorando por uma chance de fazer melhor, pois acabam assumindo a culpa por uma situação que eu causei.


Monica Stanton, definitivamente, não se encaixa nessa categoria.


Ela sabe exatamente o que quer e como fazer para conseguir que sua vontade prevaleça. Tive a oportunidade de presenciar rapidamente a dinâmica de sua relação com Richard e ficou nítido para mim quem é que manda: Ele é o provedor, mas é ela quem põe as cartas na mesa. Ela o manipula ao seu bel-prazer, consciente ou inconscientemente. Linda, sedutora, refinada, confiante, inteligente e rica. Uma combinação fatal. Eva é tudo isso também, apesar das não tão raras crises de insegurança. Agora entendo melhor a fascinação que Stanton e os outros três ex-maridos por Monica. E, principalmente, o porquê de Victor Reyes ainda ser apaixonado por ela. Se eu e Eva estivéssemos em seus lugares, eu jamais conseguiria seguir em frente. Eu nunca poderia esquecê-la.


A forma como Monica não só me chamou de cretino sem o menor receio, como também se fez clara como água ao dizer que eu é quem deveria me esforçar para me fazer digno de sua filha, independente de quem sou ou da fortuna que tenho, aumentou ainda mais meu respeito por ela. Ela me pôs no meu lugar e, apesar de ter se rendido no final, não me deixou completar a caminhada sem uma boa luta. Apesar de exaustivo, foi revigorante ser tratado dessa forma. São pouquíssimas as pessoas que me enfrentam sem medo. E Monica me rebaixou para, só depois, me tratar de igual para igual. E não teve nenhum receio disso.


Ela tem muitos defeitos, mas ser uma mãe negligente não é e nunca poderia ser um deles. 


Respiro fundo mais uma vez, me levanto da cadeira de couro atrás da mesa, e me encaminho para a sala, exausto. Monica é uma força da natureza sem dúvida. Eu não deveria tê-la julgada de forma tão leviana. 


Eva tira seus olhos do computador e me encara.


"Eu avisei", cantarola.


Ergo os braços para alongar o corpo e aliviar a tensão. "Ela vai ficar bem. É mais durona do que aparenta".


"Ela ficou feliz por você ter ligado, né? " 


Não pude deixar de sorrir. Sim, foi uma batalha difícil, mas eu não sairia dela com nada menos que a vitória. 


Eva revira os olhos. "Ela acha que eu preciso de um homem rico para cuidar de mim e me manter em segurança".


"E é isso que você tem", falo abaixando os braços.


"Só espero que não esteja dizendo isso com a conotação que um homem das cavernas usaria", ela deixa meu computador na mesinha de centro e se levanta. "Preciso ir para casa me preparar para a visita do meu pai. Vou precisar dormir em casa enquanto ele estiver aqui, e não acho uma boa ideia você aparecer no meu apartamento. Se ele confundir você com um ladrão, a coisa vai ficar feia".


"E também seria um tremendo desrespeito. Vou aproveitar esse tempo para marcar presença na minha cobertura".


"Certo", ela passa as mãos por seu rosto e seus olhos se voltam para o pulso enfeitado com o relógio que lhe dei. 


"Pelo menos tenho esta belezinha aqui para contar os minutos até a gente poder se ver de novo", seu olhar é de puro contentamento e admiração.


Eva está visivelmente um pouco mais relaxada. Contudo, a tensão pela visita de seu pai e a situação com sua mãe ainda paira no ar. Caminho em sua direção e, assim que nossos corpos estão quase colados, eu a pego pela nuca, e começo a fazer movimentos circulares em seu pescoço com os polegares, numa tentativa de deixa-la mais calma. 


"Preciso saber que você está bem", ou eu não vou conseguir ficar em paz. Se Eva está bem, tudo fica bem no meu mundo.


Ela balança a cabeça. "Já estou cansada dessa coisa de a minha vida girar sempre em torno de Nathan. Preciso pôr uma pedra sobre esse assunto de uma vez por todas". 


Eu, melhor do que ninguém, entendo sua frustração. É difícil ver que seu passado ainda governa seu futuro, mesmo que você faça de tudo para deixa-lo para trás. Sempre haverá os rastros de destruição, a forma como a situação afeta as pessoas ao seu redor, os traumas que são desenvolvidos, e não é fácil se livrar de tudo isso. Durante o resto de nossas vidas, encontraremos estilhaços, por menores que sejam, por todo o caminho que percorrermos. 


Sou um dano colateral do meu passado, um estilhaço vivo, e isso é irreversível. Nunca parei para imaginar como seria minha vida se meu pai não tivesse feito o que fez, ou se ele tivesse simplesmente sido preso. Seria tentar prever um futuro que nunca existirá. 


Olho para a mulher em meus braços e percebo que isso não importa. Todos os caminhos que percorri sozinho, longos e tortuosos, me levaram a ela. E isso é tudo o que importa.


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Narrador


As pontas de seus dedos batiam incessantemente no tampo da mesa, e o barulho cortava o silêncio sepulcral na saleta. Esse gesto transmitia sua ansiedade por notícias. A primeira fase do plano estava quase concluída. Foram necessárias algumas modificações devido à reviravolta que pegou a todos de surpresa. E, de fato, aquilo não poderia ter sido mais do que perfeito. 


O toque estridente do telefone despertou-lhe de seus pensamentos. Apertou o botão "atender" e levou o aparelho à orelha.
 

"E então?", perguntou.


"Já está feito", a voz com sotaque carregado respondeu.


Um pequeno sorriso se desenhou em seus lábios.


"Sem deixar rastros".


"Você sabe que não sou dado a amadorismos".


"Sei. Mas, em se tratando da máfia, a polícia sempre fica mais atenta".


"Exatamente. E é isso que torna o plano ainda melhor. O foco será desviado justamente porque a polícia pensará que ele foi morto por seus próprios comparsas por motivos pessoais", uma risada grossa e contida se faz ouvir. "Como não conseguirão farejar nada, o caso será arquivado e esquecido".


"Realmente, tudo saiu melhor do que o esperado", disse remexendo-se em seu assento. "Como acha que ele irá reagir a tudo?"


"Homens como Gideon Cross não deixam por menos. Com certeza ele desconfiará de nossa suposta ajuda e irá atrás da verdade".


"Acha que ele tem chances de descobrir?"


"Não me surpreenderia se conseguisse. Mas não vamos antecipar as coisas. Tudo foi muito bem arquitetado. Vamos apenas monitorar seus movimentos e aguardar o momento certo para agir".


"Certo. Repassarei tudo para o pessoal e vou para casa. Quero, no mínimo, quinze horas de sono ininterrupta".


"Faça isso. Eu mal posso esperar para tomar um bom banho e ir para os braços de minha Brigitte".

"Aproveite bastante", disse com um sorriso enviesado. "Até amanhã".


"Até".


Após desligar o telefone, fechou os olhos e respirou fundo. Tudo estava caminhando bem. Mas não poderia relaxar completamente. Estava mais envolvido do que todos naquele plano. A espera estava sendo longa e angustiante.


Pegou uma foto recortada de uma revista que estava em cima de sua mesa. Tratava-se de Gideon beijando Eva Tramell numa rua movimentada. Formavam um belo casal. A mulher era linda e eles pareciam mais do que apaixonados. E ela deveria valer mesmo a pena a ponto de um dos homens mais importantes do mundo sujar as próprias mãos de sangue. 


Fitou aquela imagem durante um longo tempo, completamente imerso em pensamentos. 


Faltava pouco, muito pouco. 


A detetive Graves é mais esperta do que ele poderia supor. Sabia que ela desvendara o mistério, mas não tinha como provar. E, depois de seu plano ter dado certo, agora seria impossível acusar Gideon. Ninguém poderia atingi-lo novamente. Ele não permitiria.


Assim que a detetive desse o caso por encerrado, tudo estaria resolvido. 


E ele poderia ficar em paz. 


...


Gideon


"Você tem certeza? ", pergunto, enquanto ando de um lado para o outro em meu escritório no Crossfire. 


É hora do almoço e eu até estava morrendo de fome. Mas agora, tudo o que consigo sentir são os movimentos do meu estômago se revirando. 


"Sim", responde meu advogado. "Acabei de ser informado. Nem você nem Richard Stanton são suspeitos. Com essas novas evidências, os detetives não têm outra escolha a não ser encerrar o caso".


"Que tipo de evidências? Eles chegaram a mencionar algum nome? "


"Não. Como as provas tiram a polícia do seu encalço, não há razão para falar sobre os detalhes da investigação até que o inquérito seja concluído. No entanto, deram a entender que Nathan estava se envolvendo com pessoas altamente perigosas e, por esta razão, o foco da investigação deve mudar".


Suas palavras me deixam tanto intrigado quanto preocupado.


"O quão perigosas?"


"Pela forma como eles reagiram quando perguntei, meu palpite é tem duas palavras: máfia russa".

Meu sangue gela. Isso está ficando cada vez pior.


"Não acredito que ele chegasse a tanto? Como diabos aquele sujeito conheceria alguém da máfia?"


"Não faço ideia. Mas já vi muitas coisas nesse mundo que julguei impossíveis. Não duvido de mais nada. Porém fique tranquilo. Você saiu do rastro da polícia e é isso o que importa. Está tudo bem".

Eu gostaria de acreditar nisso.


Conversamos sobre mais alguns detalhes e, por fim, desligo. Arranco o headphone e o jogo sem nenhum cuidado sobre a mesa. Sento pesadamente em minha cadeira e fecho os olhos, respirando fundo.


Minha segunda-feira começou corrida e tensa. A preocupação com Eva não diminuiu nenhum milímetro sequer e tenho muito o que fazer no escritório. E, como se não bastasse, mais essa notícia. Eu nunca quis tanto um analgésico em toda a minha vida. 


De repente, ficou pesado demais lidar com isso sozinho. Eu preciso dividir isso com alguém. E, por mais que eu saiba que Eva está preocupada com o pai, é melhor que eu mesmo dê a notícia a ela antes da polícia.


Pego meu aparelho e disco o número do celular clandestino que dei a Eva para que conseguíssemos nos falar sem ser interceptados.
 

O celular toca agonizantemente umas quatro vezes antes de ela atender.


"Alô?"


"Meu anjo", respondo, acalentado pelo som de sua voz. 


"Oi. Aconteceu alguma coisa?" ela parece surpresa pela minha ligação. 


"O meu advogado acabou de me contar que a polícia está na pista de um suspeito", sou direto. Não adianta enrolar agora.


"Quê?" gincha, "Ai, meu Deus". 


"E não sou eu", completo, na tentativa de que este pedaço de informação soe como uma boa notícia.


Eu só não sei se estou fazendo isso para acalmá-la, ou para tentar me convencer disso também.




*escritora com as mãos doendo de tanto escrever* EPAAAAA! que tenso, hein! Gentee esses dois não vão ter paz nunca! Minha nossa!

Capítulo gingantão, né nón? Compensou a espera? Espero que sim!

Bom, agora, a gente se vê na quarta, ok? E muuuuito obrigada a quem comprou meu conto na Amazon!! Vocês são demais! Para quem se interessar, o link tá no meu perfil!

Beijooo a todas e até mais :*

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